A avenida Tiradentes, no centro histórico de São Paulo, integra a ligação rodoviária Norte-Sul da cidade. Com isso, diante do Convento da Luz, construção que começou a ser erguida em 1774, há nada menos que dezesseis faixas de carro, oito no sentido norte e 8 no sentido sul, e um guardrail contínuo de concreto separa as pistas que vão daquelas que vêm.

O Convento da Luz em foto de Militão Augusto de Azevedo de 1862

Convento da Luz e Museu de Arte Sacra. Foto: FMM, outubro/2016

O Jardim da Luz, também na avenida Tiradentes, foi inaugurado em 1825 e é o primeiro Jardim Público da cidade. E, da mesma forma que o Convento, convive com as 16 faixas de carro e o nefasto guardrail de concreto.

Jardim da Luz em 1908. Foto de Guilherme Gaensly

A planta da cidade de 1881, mostra o “Campo da Luz”, um alargado que seguia desde a linha do trem até um largo junto à ponte Pequena (sobre o rio Tamanduateí). Imagine! Se mesmo onde não havia espaço para grandes vias, nosso urbanismo rodoviário as criou, que dirá desse espaçoso Campo da Luz?

Trecho da Planta da Cidade de São Paulo, levantada pela Cia Cantareira e Esgotos, engenheiro Henry B. Joyner, 1881. O número 46 indica o Convento da Luz.

Naturalmente, não passamos diretamente do Campo da Luz para o modo guardrail de concreto. O local teve seu tempo de avenida urbana, com bonitos canteiros arborizados. Uma foto do início da década de 1950 mostra, além dos canteiros, o grande monumento em homenagem a Ramos de Azevedo que ocupava o centro da avenida, bem diante da atual Pinacoteca de São Paulo e da rua São Caetano (rua das noivas).

Foto da Avenida Tiradentes, em primeiro plano à esquerda o viaduto sobre os trilhos da ferrovia em direção à rua Brigadeiro Tobias e à direta o final do viaduto em continuação à rua Florêncio de Abreu. Início da década de 1950. Autor desconhecido.

Abaixo, a foto aérea de São Paulo de 1958 mostra a Avenida Tiradentes ainda com seus canteiros e o grande monumento a Ramos de Azevedo, mas é possível notar um novo viaduto sobre a ferrovia, bem mais largo, que foi construído no meio dos antigos.

Trecho de foto aérea de São Paulo de 1958 http://www.geoportal.com.br/memoriapaulista/

Essa nova passagem de carros foi feita bem na direção do monumento a Ramos de Azevedo! Com isso, aos poucos, os carros começaram a estrangular o monumento! A simples modificação no traçado das vias e canteiros rompeu com a antiga lógica da sua inserção urbana.

Foto da avenida Tiradentes, final da década de 1950. Acervo Estadão.

O Monumento, com 25 m de altura e 22 toneladas, criado por Galileu Emendabili, acabou sendo removido dali.  Ele durou na avenida Tiradentes pouco mais de três décadas, havia sido inaugurado em 1934, e começou a ser desmontado no final de 1967, no mandato do prefeito Faria Lima. A justificativa para a remoção foi desafogar o sistema viário e permitir a construção do trecho da linha Norte Sul do futuro metropolitano. Embora o metrô, que cruza sob a ferrovia, esteja muitos metros abaixo do local onde ficava o monumento.

Imagem da Folhapress de janeiro de 1968: o desmonte do monumento

O monumento passou vários anos desmontado no Jardim da Luz. Em meados da década de 1970, acabou sendo transportado para o Campus da USP e lá remontado no meio de uma rotatória viária. Completamente desambientado, entre os edifícios modernos e seus estacionamentos, perdido no traçado urbano também moderno da Cidade Universitária. O monumento já está ali há aproximadamente 45 anos! Bem mais tempo do que passou no espaço urbano para o qual foi concebido.

Campus da USP, trecho da foto aérea de São Paulo de 2004, a flecha indica o Monumento a Ramos de Azevedo. http://geosampa.prefeitura.sp.gov.br/PaginasPublicas/_SBC.aspx

E, no centro da cidade, os guardrails, também desambientados, próprios de autoestradas, destoam em qualquer espaço urbano, mas mais ainda num centro histórico como é o caso em São Paulo.

Avenida Tiradentes, passagem sobre a ferrovia. Foto: FMM, junho de 2016. Ao fundo, a Igreja de São Cristóvão (Antiga capela do Seminário Episcopal, edifício de meados do séc. 19)

Mas algo ali é bastante urbano. Quase em cima dos viadutos que cruzam a ferrovia, um grafite do artista de rua Daniel Melim ocupa, desde 2011, a empena cega do edifício Embassy (av. Prestes Maia, 931). É um pequeno consolo. Efêmero há quase uma década.

Grafite do artista de rua Daniel Melim, 2011. Foto: FMM, julho, 2019

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